Quando o medo é pior que a violência em si

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Quando eu li Diários De Bicicleta, de David Byrne, algo que me chamou muito a atenção foi o ciclista falando sobre as cidades dominadas pelos carros e o quanto isso as tornava inseguras em geral.

Isso porque as ruas vazias de pessoas se tornam o esconderijo perfeito para os mal intencionados. Enquanto regiões ou cidades em que pessoas ocupam as ruas, seja a pé ou de bicicleta, se tornam mais seguras, o movimento das pessoas nas ruas inibindo a ação criminosa.

Essa constatação me chamou a atenção porque ela é contrária ao que muitos acreditam. Em tempos atuais não é raro que eu ouça de vizinhos, familiares e amigos o quanto sou louca de sair por aí não sendo de carro.

Em teoria a armadura de ferro e vidro seria mais segura.

Normalmente eu repito o mantra: me sinto mais segura que eles em minha bicicleta e incrivelmente mais segura quando estou a pé, acredito que chamo menos a atenção, consigo perceber melhor o que está a minha volta e, ainda, percebo que estou mais alerta. Na verdade a sensação é um misto de liberdade e segurança, me sinto a verdadeira dona do meu nariz.

Apesar disso é claro que eu me sinto um tanto insegura quando estou em alguma rua que não conheço bem ou quando as ruas estão muito desertas. Recentemente percorri algumas ruas entre a estação Clínicas e o consultório da dentista da Carol em Higienopolis e em boa parte do caminho eu estava absolutamente sozinha, não fosse uma região em teoria segura eu provavelmente teria desistido no meio do caminho e pego um táxi.

Uma coisa que talvez tenha pesado em minha decisão de continuar é minha incapacidade de me render ao medo. Quero poder viver minha cidade em plenitude e isso significa aproveitá-la, vê-la por completo – por isso destaque a este trecho do livro Morte Súbita na imagem.

Mas o que me moveu a escrever este texto foi outro medo: numa reportagem de televisão descubro que um empresário americano resolveu usar material de coletes a prova de balas para fazer mochilas e em seu site é possível ver vídeos em que as crianças são orientadas a como agir em caso de ataque, usando a mochila como escudo.

Um lado meu se assusta porque se ele investiu nisso é porque existe mercado – segundo ele a venda dobrou depois do último atentado ocorrido agora em dezembro – e é o mercado do medo.

Não sou uma das que acredita que isso acontece porque o direito a portar uma arma é garantido pela constituição dos EUA, até porque esse direito não existe na nossa e isso não impede que mais pessoas morram por aqui.

Mas acredito que tem algo de muito errado quando crianças precisam se proteger em suas escolas, um dia consideradas extensões de suas casas. Há alguma coisa de errado quando as pessoas acreditam que sair de condomínios de muros altos e cercas elétricas dentro de carros com vidros filmados e muitas vezes blindados em direção de shoppings aonde encontrarão apenas seus iguais é a única forma de se sentirem seguros.

Para 2013 torço pelo contrário. Torço por mais pessoas nas ruas, por mais sorrisos despreocupados. Torço, de verdade, para que o medo não triunfe porque viver assim é porque a violência em si.

Escrito por Simone Fernandes

Formada em contabilidade, sempre teve paixão pela palavra escrita, como leitora e escritora. Acabou virando blogueira.

Escreve sobre suas paixões, ainda que algumas venham e vão ao sabor do tempo. As que sempre ficam: cinema, literatura, séries e animais.

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