Fim da humanidade

Não sei se já usei esse título para algum post aqui neste blog, se não usei garanto a vocês que não raras vezes pensei em fazê-lo, por diversos motivos.

Cena 1: família não sabe exatamente aonde quer almoçar, então reúne-se no final da escada rolante do shopping, impedindo a quem sobe em seguida de seguir seu caminho sem tropeços.

Cena 2: existe uma empresa de telemarketing na Praça Osvaldo Cruz, na Avenida Paulista. Diariamente, pela manhã e no horário de almoço, dezenas, quem sabe centenas, de funcionários precisam passar por apenas duas catracas de acesso ao prédio. Uma ou duas filas se formam, enormes, cruzando a calçada de maneira que quem quer seguir num sentido ou outro da avenida precisa desviar até à rua ou pedir licença enquanto se impõem a alguém que não quer deixá-lo passar.

Cena 3: uma mãe ensina à sua filha de 6 anos que mendigos são ladrões e assim garante que ela terá medo deles e se manterá em segurança.

Cena 4: uma  jovem finge dormir no trem do metrô, isso para evitar ter de levantar caso algum idoso ou deficiente se aproxime do banco que ela ocupa.

Cena 5: Um carro acelerá ao se aproximar da esquina a fim de assustar ao pedestre que, inadvertidamente, está atravessando a rua antes vazia.

Cena 6: um morador de prédio nem tão chique assim sai apressado de casa. Ele não dará bom dia ao porteiro, provavelmente não cumprimentará o taxista, tratará mal a moça do café e ignorará o faxineiro.

Os exemplos poderiam continuar seguindo, seguindo e seguindo. Diariamente uma ou duas cenas dessas acabam fazendo parte do meu cotidiano. Às vezes eu sinto só raiva, às vezes eu sinto uma mistura de raiva e tristeza, desilusão pelo que virá.

Desilusão porque enxergo em cada um desses pequenos atos o fim da humanidade. Não, não estou falando do conjunto de pessoas que vivem em sociedade, mas estou falando daquele detalhe da natureza que faz com que sejamos uma sociedade, aquele detalhe que faz com que eu reconheça no outro um pedaço de mim, um igual e faz com que eu enxergue que este outro tem os mesmos direitos, e deveres que eu. Que ele merece meu respeito porque eu mereço ser respeitada.

Corta para o interior da Paraiba, cidade de Queimados. Lá, numa festa de aniversário, dois rapazes resolvem que o estupro de cinco mulheres é um presente de aniversário. Não, você não leu errado: eles estupraram 5 mulheres, matando duas que teriam reconhecido quem eram, como presente de aniversário.

Aí você me pergunta o que essas cenas tem em comum: pois na minha cabeça, julgue você exagerada ou não, elas tem em comum essa coisa de não se enxergar no outro. Aqueles homens não enxergavam a si mesmos naquelas mulheres e então elas se tornaram objetos, coisas a serem usadas para seu prazer.

Eles se vem como superiores à elas e a todos nós. Eles tem seu tanto de crueldade individual, mas tem seu tanto de acharem que a sociedade não punirá, de que a sociedade até aprova o que eles fizeram, afinal alguns dizem que a vítima do estupro na verdade é culpada, não é?  Tem um tanto de machismo aqui, tem seu tanto de individualismo e muito, muito, de falta de humanidade.

Isso em pleno século 21, isso depois de termos sido “iluminados” pelo conhecimento.

São extremos de uma verdade muito, muito triste.

E eu,como mãe, volto a sentir a indignação, a tristeza e muito, muito medo. Medo pelo amanhã.

Veja os textos que fazem parte dessa blogagem coletiva no blog das Blogueiras Feministas e no LuluzinhaCamp.

Escrito por Simone Fernandes

Formada em contabilidade, sempre teve paixão pela palavra escrita, como leitora e escritora. Acabou virando blogueira.

Escreve sobre suas paixões, ainda que algumas venham e vão ao sabor do tempo. As que sempre ficam: cinema, literatura, séries e animais.

5 Comentários


  1. Si,

    preciso que você segure as pontas aí, pq quando me vejo perdendo a esperança, lembro de você sempre acreditando. Em conversas com amigos, costumo dizer que a sociedade que conhecemos está ruindo, e o argumento principal que uso é que toda grande nação caiu quando o prazer ficou acima dos valores.

    O que me conforta é saber que vivemos em um mundo ciclico, o sistema capitalista atual é corrupto e nos corrompe, e recomendo zeigeist que fala muito bem sobre isso, as midias sociais ao meu ver veio fortalecer o lema “imagem é tudo” e com isso vejo todos nós agindo em maior ou menor grau de forma fútil e superficial

    A coisa boa é que assim como eu e você temos visto e nos incomodado com algo muito errado na forma de vivermos, outras pessoas também começaram a questionar a forma que o mundo está vivendo. quem sabe 2012 não seja simbolico, o fim do mundo na verdade seja o começo de uma nova sociedade, ou melhor dizendo, uma nova maneira de vivermos em sociedade.

    eu tenho esperança

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  2. Concordo! Essas cenas me chocam, me dão nojo, me fazem desacreditar no ser humano… me desanimam. Faço a minha parte e confio da justiça divina, mas não deixo de ficar indignada com tanta falta de educação, fé, amor, Deus… na verdade nem sei o que falta nesse povo. 🙁

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