A minha primeira vez com as Pedalinas

Mudar a forma com que fazemos as coisas pode ser um processo mais longo ou mais curto, depende de um monte de coisas. Às vezes depende de uma coisinha de nada que finalmente te empurra na direção do que você realmente queria.

Quando eu abandonei o carro – 05 anos atrás – eu precisei de um empurrão para também abandonar o táxi, o ônibus e começar a caminhar. Dá onde ele veio? Não sei ao certo, acho que foi um daqueles dias em que o trânsito para, você desanima de olhar aquele monte de carro, um atrás do outro, do outro, do outro, e simplesmente sai andando.

O descobrindo da bicicleta, como eu já disse aqui, foi mais um lance de lógica que de descobrimento: “poxa, porque eu não pensei nisso antes?”

Por uma dessas coincidências desta vida, faz pouco mais de um ano em que a lógica venceu e eu comecei a juntar a grana para a minha bicicleta dobrável. E faz um ano que a Penélope Jones (ela aí em cima, na estação Vila Madalena do metrô) entrou em definitivo em minha vida.

Depois disso foi um tempo aprendendo a nova gravidade da bicicleta, criando força nas pernocas, melhorando o preparo físico, tudo isso na ciclovia do Parque Villa lobos. Aí vieram os vários blogs sobre o assunto, as pessoas que comecei a conhecer no twitter, aquela coisa do universo conspirar a seu favor e lhe indicar os caminhos.

Conheci as Pedalinas, conversei com algumas no twitter, entrei para a lista de discussão e sempre falava que ia a algum encontro, mas nunca dava certo. Passei a contribuir de vez em quando para o blog, a participar mais ativamente das discussões, enquanto ainda ia criando coragem para ultrapassar a barreira que parecia se erguer nos contornos do meu bairro.

Eu já ia à padaria, ao mercado e ao salão de beleza, dava voltas, subia e descia por aquelas ruas, mas não me sentia preparada para ir mais longe. O lado “racional” repetindo: é que você ainda não tem preparo físico, vai que você vai, mas não consegue voltar? Para ajudar parecia que sempre algo tinha que acontecer e me impedir de ir a algum encontro das Pedalinas.

Mas o universo sabe o que faz e enquanto o grupo de meninas ciclistas se preparava para comemorar 02 anos de aniversário, eu me preparava para comemorar 1 ano com minhas bicicleta. Respirei fundo, encarei o medo e falei: agora vai. Saí de casa em direção do Metrô Vila Madalena, respirei fundo e coloquei força no pedal. Empurrei no final da avenida, mais por medo dos ônibus que se seguiam que pela falta de energia.

Coloquei a Penélope no elevador – psssss, não pode, mas juro que tava vazio! – ouvi do segurança que era a bicicleta da Chapeuzinho Vermelho, me senti um ET dentro do vagão, com todos olhando para mim, e desembarquei na estação Consolação. Lá encarei a escada rolante e contei com uma santa alma amiga para me ajudar a segurar a bike quase do meu tamanho – Quando será que eles vão colocar aqueles frisos na lateral para podermos empurrar a bike?

Empurrei a bike pela calçada da Paulista em direção à Praça d@ Ciclista. Chegando lá encontrei outras meninas que estava lá pela primeira vez. Dividimos experiências, falamos do que nos dá medo, de nossos caminhos. Expliquei que eu não criava coragem de vir pro trabalho de bike, afinal, tem uma Avenida Dr. Arnaldo no meio do caminho.

O grupo foi crescendo, encontrei as garotas que eu só conhecia por suas linhas escritas. Embarquei com elas pela avenida que eu vejo todo dia a pé, que eu cruzo de uma ponta a outra há tanto tempo.

Passamos em frente a Casa das Rosas e então da Starbucks aonde eu compro meu café que me ajuda a enfrentar o dia. Seguimos pela Vergueiro em obras, então ao lado da praça do metrô Liberdade, subimos ao lado do Fórum, descemos a lateral da Catedral da Sé, rodamos como loucas no Marco Zero, fomos ao Patéo do Colégio, passamos em frente ao Mosteiro de São Bento aonde casei, então a Ipiranga, a República, subir a Augusta. As meninas ainda pararam para um sorvete no começo da Augusta, ganhar energia para o resto da subida, sabem?

Mas eu tinha que ir embora por conta de um compromisso da pequena. E agora, como faz? Eu podia subir a Augusta até a Paulista e voltar de metrô. Eu podia dobrar a bike e embarcar em um táxi.

Eu fui seguindo e pensando, seguindo e pensando, seguindo e pensando.. Epa, olha a Dona Antonia aqui, ela já sai na Consolação e a Consolação tem corredor de ônibus no meio, ao contrário da Augusta. Seguindo para a Consolação e pensando… Entrando na Consolação e pensando. Afff, tá difícil essa subida, vou apelar para a calçada… Hum, aqui dá para eu voltar para a avenida… Ah, ali tá a entrada da Dr. Arnaldo, lá tem ponto de táxi… Nossa, a Dr Arnaldo tá livre, será que eu consigo? Hum, acho que vou seguir aquele ciclista ali, ele sabe o que tá fazendo… O farol fechou, vou aproveitar e já ir para a pista do meio, agora eu encosto, olha, mais três ciclistas. Tudo bom? Um motoqueiro buzina, o ciclista fala comigo, já estou na baixada da Dr. Arnaldo. Nossa, tô cansada. Parar e tomar um pouco de água. Continuar, aff, outra subida. Agora a Alfonso Bovero. Hummm, quanto carro, calçada vazia, larga, lá vou eu de novo. Volto para a rua, passo por um ônibus, cumprimento com a campanhia, faço um positivo com a mão, assim ele não me incomoda no resto do caminho. A descida da Alfonso!! O vento no cabelo!! Agora falta pouco, eu vou conseguir! Um carro resolveu disputar espaço comigo, desacelero. Epa, pera aí: EU VIM ATÉ EM CASA DE BICICLETA?!?! EU PEGUEI A DR. ARNALDO DE BICICLETA?!?!?

Quase 20 quilometros percorridos nas ruas de SP!

Eu aguentei. E a certeza de que fiz a melhor coisa do mundo, a certeza de que estou quase vencendo o medo. Não, não tá faltando perna, tá faltando coragem. Mas falta pouco, vocês vão ver!

Escrito por Simone Miletic

Formada em contabilidade, sempre teve paixão pela palavra escrita, como leitora e escritora. Acabou virando blogueira.

Escreve sobre suas paixões, ainda que algumas venham e vão ao sabor do tempo. As que sempre ficam: cinema, literatura, séries e animais.

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