Contos de fadas são sombrios em sua origem, pesando na dramaticidade e horror, pelo menos a maioria deles. Foram suavizados e tiveram sua moral ajustada para o público infantil há tantos séculos que vê-los mais próximos sua abordagem original é sempre impactante. Por isso, A Meia-Irmã Feia, releitura de um conto de fadas icônico, é um lançamento que causa estranheza, ao mesmo tempo que desperta um interesse quase mórbido ao remeter a elementos da história que foram sublimados há muito tempo.
Em A Meia-Irmã Feia temos uma provocativa releitura da clássica história da Cinderela. Na trama, Elvira luta contra sua linda meia-irmã, a Cinderela em questão, em um reino onde a beleza suprema reina. Ela recorre a medidas extremas para cativar o príncipe, em meio a uma competição implacável pela perfeição física.

Recontando uma história secular, o filme se atualiza ao focar em temas que permanecem em debate na nossa realidade contemporânea. A pressão por padrões estéticos, a necessidade compulsória de ser amada, o ridículo que não encontrar espaço para ser quem se é. Ao trabalhar esses pontos em uma abordagem de body horror, Emilie Blichfeldt, em sua estreia como diretora, acrescenta ainda mais uma camada de atualidade na história.
O corpo como causa de horror é um gênero cinematográfico definitivamente em alta. Pense em A Substância (2024), Juntos (2025) e Titane (2021), por exemplo. Grandes títulos recentes do gênero onde o mais aterrador para a protagonista é algo que acontece com seu corpo. Não por acaso, são todas histórias de protagonismo feminino. Como diz o meme que circula por aí, às vezes um filme de body horror é apenas um filme sobre uma mulher.
A Meia-Irmã Feia conecta todas essas pontas, origem e releitura, clássico e atualidade, com grande maestria. Com algum humor, essa história é (re)contada em uma execução cuidadosa e estéticamente encantadora. É impossível ver a escalada vertiginosa de obsessão pela beleza de Elvira e não sentir algo de cômico, enternecedor e angustiante. A vontade é de sacudi-la pelos ombros e dizer “Mulher, pare de se cobrar tanto!”. Mas sendo honestas, nós mesmas conseguimos deixar de lado essa cobrança interna? A resposta você já sabe. Por isso, é tão natural se conectar com essa história. Inevitável, eu diria.
Destaque no Festival de Cinema de Sundance e Berlin International Film Festival 2025, A Meia-Irmã Feia levou mais de 700 mil pessoas aos cinemas do México e estreia exclusivamente nos cinemas brasileiros no dia 23 de outubro, com cópias dubladas e legendas, com distribuição da Mares Filmes e a Alpha Filmes.