Ano novo, vida nova e boa parte da população corre atrás da mais comum meta: mudar de hábitos, alimentar-se corretamente e fazer exercícios físicos.
Não deve ter sido à toa a escolha da Netflix em estrear Você é o que você come – As dietas dos gêmeos no dia primeiro de janeiro.
A série documental, produzida pelo serviço de streaming e financeiramente apoiada por empresas que oferecem alimentos para dietas veganas e vegetarianas, acompanha um estudo realizado pela Universidade de Stanford cujos resultados foram apresentados ao público em novembro passado.
O estudo em questão acompanhou 22 pares de gêmeos idênticos que receberam diferentes dietas, uma baseada em plantas e a outra onívora, ao longo de 8 semanas a fim de identificar como essa diferença entre dietas poderia afetar a longevidade e saúde de uma pessoa.
Particularmente eu achei a série muito interessante, mas acho muito importante destacar dois pontos: o estudo em questão, ainda que conduzido por cientistas e com apoio da universidade, não pode ser considerado uma pesquisa científica, já que o grupo selecionado é muito pequeno para ser considerado uma amostra adequada e, também, porque o período de realização do estudo não foi longo o bastante. O segundo ponto, citado acima, é que o seriado claramente trás o viés bastante crítico ao consumo de carnes e derivados, tendencioso até.
Agora, se você tiver isso em mente desde o início, o seriado traz muita, MUITA, informação interessante e abre espaço para uma discussão bastante interessante sobre costumes alimentares e a forma como nossas decisões individuais afetam a sustentabilidade da vida humana em longo prazo.
A produção optou por centralizar suas cenas em 4 das duplas de gêmeos participantes e intercala as informações sobre o estudo com cenas sobre as alternativas que tem surgido na indústria que facilitariam a opção por uma alimentação totalmente baseada em plantas. O sucesso de empresas como Impossible Foods, produtora de carnes vegetais, e Miyoko, produtora de queijos vegetais que conseguiu até mesmo criar um queijo para pizza que realmente engana nosso cérebro, mostra que existem caminhos menos dolorosos aos amantes destes sabores, enquanto histórias de como as indústria pecuária tem prejudicado o meio ambiente sustentam o argumento de que uma mudança imediata é necessária.
O estudo consistiu de 8 semanas: primeiro todos foram submetidos aos mais diversos testes de saúde e condicionamento, com base nisso foram criadas dietas personalizadas para cada participantes, sempre considerando que um dos gêmeos seguiria uma dieta saudável onívora e o outro uma dieta vegana. Nas duas primeiras semanas a dieta foi entregue na casa de cada um, nas duas seguintes eles foram auxiliados a fazer suas compras e cozinhar sua comida considerando suas necessidades diárias e nas duas últimas seguiram sozinhos nas compras e na cozinha. Ao início do do estudo eles também receberam programas de treinamento a serem seguidos.
A ideia geral de basear o estudo em gêmeos idênticos seria conseguir medir de forma mais precisa os benefícios das dietas, já que em teoria os genes dos dois são iguais. Mas falhas no estudo como permitir que os participantes alterassem seus treinos em função de suas necessidades ou, ainda, alterassem suas dietas diminuindo quantidades, acabam por tornar os resultados menos confiáveis.
Principalmente porque a diferença nos resultados obtidos para cada um dos gêmeos em cada par foi tão pequena que permanece a dúvida: foi mesmo o fato de ser baseado em plantas ou foram as alterações que eles fizeram? Em uma dupla a irmã que estava se alimentando da dieta onívora diminuiu deliberadamente a quantidade de carboidrato que consumia, com isso acabou por perder massa magra ao invés de gordura ao longo do período. Já em outra, um dos irmãos treinou em uma academia exatamente conforme instruído, enquanto o outro preferiu fazer treinos em casa com os filhos atrapalhando – tipo eu tentando fazer Yoga com a minha cachorra vira-lata lambendo a minha cara.
Considerando tudo isso, o que eu levo comigo da série é a comprovação de que uma dieta variada, seja ela onívora ou vegana, que considere suas necessidades reais, aliada a prática de exercícios físicos de fortalecimento e cardio, adotadas em qualquer momento de nossas vidas, tem efeitos palpáveis em nossa qualidade de vida e capacidade cognitiva.
Assim como é muito legal ver que a indústria tem entendido que não basta apelar a nossa preocupação com o meio ambiente ou nosso amor aos animais para nos vender a substituição alimentar: comer é muito mais que enfiar o garfo em algo em nosso prato, precisamos ter prazer visual, precisamos nos sentir satisfeitos, caso contrário, em pouco tempo, estaremos abandonando qualquer dieta, por mais saudável que ela seja.
Torço, de verdade, que ter uma dieta baseada em plantas se torne algo viável para mais pessoas – mais barato e com acesso mais fácil – e mais prazerosa. Até porque a alternativa não existe: o planeta não terá capacidade de fornecer uma dieta baseada em carne capaz de atender às necessidades alimentares de todos.
P.S. Ouvir uma cientista falando que o IMC (índice de massa corporal criado por um astrônomo cujo uso acabou sendo disseminado como fórmula para saber se uma pessoa está saudável) é o mesmo que “coco de cachorro” foi um dos momentos mais prazerosos que tive em minha vida!
P.S. do P.S. Como comentei acima, uma das coisas que o estudo confirmou é que essa história de cortar carboidrato não está com nada. Nosso corpo precisa de energia para funcionar, nossos cérebro consome um absurdo de calorias. Uma dieta variada, que tenha carboidratos, vegetais e fontes de proteína é a nossa melhora aliada para uma vida saudável. Além do resultado negativo para uma das participantes, a dupla de irmãos da imagem acima, que já treinavam muito, começaram o estudo com pouca gordura corporal, foram os que mais se beneficiaram das dietas recebidas, que fizeram que com eles comessem mais do que o que estavam acostumados. Os dois ganharam massa magra, melhoraram os níveis de colesterol e açúcar no sangue e disseram se sentir mais dispostos ao final das 8 semanas.
P.S. do P.S. do P.S. Optar por uma dieta baseada em plantas é difícil, principalmente quando culturalmente o consumo da carne é tão arraigado. Do outro lado, reduzir o consumo de carne semanal é um pequeno passo que faz diferença – além de nos obrigar a buscar por alternativas alimentares, uma aventura que pode ser muito prazerosa.
P.S. do P.S. do P.S. do P.S. Gente, que coisa mais linda as fazendas de cogumelos!!!! <3