Cinema: Instinto

Nicoline, psicoterapeuta muito experiente começa um novo emprego em uma instituição penal. Lá, deve tratar e avaliar Idris, um perigoso criminoso sexual. Idris é sociopata e narcisista, divertindo-se em seduzir suas vítimas para depois estuprá-las (com tanta violência que chega a quebrar a pélvis de uma delas) e matá-las. Os colegas de Nicoline acreditam que Idris já não representa perigo e pode ser reintegrado à sociedade. Nicoline discorda veementemente. Apesar de reconhecer o perigo em seu paciente e de toda a sua experiência profissional, ela vê-se enredada por Idris.

É um filme forte. Mais que isso, é profundamente incômodo e chegou a me causar repulsa em certos momentos. Foi revoltante ver uma profissional tão experiente deixando-se envolver pelo maníaco abusivo do Idris. Alguns discursos do filme são rodriguianos, seguindo a linha do “mulher gosta de apanhar” sem questionar essa premissa. Não é à toa que algumas pessoas consideram Instinto uma produção antifeminista.

Só que há mais no filme. Nicoline não é apenas uma profissional competente, mas uma mulher que carrega algum trauma, provavelmente deprimida, talvez suicida, com claros problemas de intimidade. Nada disso é dito com todas as letras, mas pistas são dadas ao espectador desde as primeiras cenas. No movimento mais óbvio, Nicoline arruma a maquiagem em um espelho composto de fragmentos – a metáfora não é nada sutil, mas está lá para guiar os mais distraídos. Por outro lado, há momentos em que o espectador chega a questionar se Idris não estaria, realmente, recuperado, e se a rigidez de Nicoline não partiria de suas próprias experiências anteriores, numa avaliação parcial do criminoso.

O desfecho (que, embora ótimo, merecia um pouco mais de cuidado para incrementar a verossimilhança) me levou a questionar todo o arco dramático, desde o início. Deu um novo alento ao filme, deixando a impressão de que Nicoline é tão capaz e forte quanto parece ser na cena inicial.

Primeiro trabalho de direção da atriz Halina Reijn, Instinto teve orçamento baixo e foi rodado em 23 dias (precedidos por anos de trabalho no roteiro). O elenco é famoso: Idris é interpretado por Marwan Kenzari (o Jafar de Aladdin) e Carice van Houten (a Melisandre de Game of Thrones) faz Nicoline. As interpretações são excelentes e a trilha sonora tem papel importante na construção da tensão. Estreia amanhã, 16 de janeiro de 2020.

Recomendo, com a ressalva de que é um filme bastante pesado.

Escrito por Lu Monte

Aprendiz em tempo integral. Viciada em seriados e com a eterna meta de ler 52 livros e ver 52 filmes por ano (cumprida nos últimos tempos!). Refugia-se na ficção, sempre melhor que a realidade.

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