Teatro: Morte Acidental de Um Anarquista

No final do ano o marido disse: quero ir ao teatro rever Morte Acidental de Um Anarquista! Corro eu descobrir do que ele falava, já que não tive a oportunIDADE de assistir a versão estrelada por Antonio Fagundes no final dos anos setenta, começo dos anos 80.

O espetáculo original é do dramaturgo italiano Dario Fo, que o escreveu em 1971 e ganharia o prêmio Nobel de Literatura em 1997, inspirado em um caso real: na Milão de 1969 um anarquista se “suicida” pulando pela janela da delegacia durante um interrogatório feroz – estamos falando da época do fascismo, quando pouco respeito era dedicado aos suspeitos de qualquer coisa.

A história do suicídio foi contada pelas autoridades foi extremamente absurda e, ainda assim, o caso foi arquivado.

A peça traz como personagem principal um louco cuja doença é interpretar pessoas reais. Ele é detido na delegacia por falsa identidade, a mesma delegacia em que um juiz deve chegar para investigar o misterioso caso do anarquista. A polícia afirma que ele teria se jogado pela janela do quarto andar. A imprensa e a população acreditam que foi jogado. O que teria acontecido realmente?

O visível desespero de todos na delegacia acaba por permitir que o louco vá enganando um a um, assumindo várias identidades e, brincando com o que é ou não é real, desmonte o poder e descobra a verdade.

Corta para 2016/2017.

As portas do teatro se abrem e o público é recebido pelos membros do elenco cantando. Os avisos são então dados e o espetáculo começa.

Opa, espera, tem algo de diferente: Dan Stulbach, o louco, ignora qualquer regra formal para o teatro. Ele conversa com o público, explica rapidamente do que fala a peça, questiona um tanto de coisa, brinca com quem participa. Ah, e autoriza que a peça seja fotografada e filmada, desde que sem flash, pedindo que, ao compartilhar, não esqueçam de marcar o pessoal da produção.

É esse o clima que se mantém a partir de então. Encerradas as explicações – ou o bate papo – Stulbach coloca o cabelo para cima, encarna o papel e a peça começa.

Enquanto o comissário (Marcelo Castro) sai de cena para verificar algo, o louco convence o delegado (Henrique Stroeter) e o secretário de segurança (Riba Carlovich) de que é um juiz. Eles ainda lidam com a novidade quando recebem uma jornalista (Maíra Chasseraux) entra em cena com questões sobre o que realmente aconteceu e acaba obtendo informações de ninguém menos que nosso louco. Ou seria um engenheiro? Ou seria um bispo?

Enquanto Dan vai assumindo as várias personalidades que servem ao louco é impossível ficar indiferente na platéia: você ri dos absurdos. Ainda que algumas vezes você ria para não chorar, já que o pano de fundo da peça se tornam os acontecimentos recentes em nosso país no campo político – a Operação Lava-Jato é citada mais de uma vez.

A ideia toda do espetáculo é provocar mesmo: o Louco é o único personagem inteiramente de ficção, os demais foram inspirados por pessoas reais, ele é um pouco de cada um de nós quando algo que parece ficção acontece na vida real..

É delicioso ver como o espetáculo pode ser crítico e ainda assim leve. Rimos principalmente quando nem mesmo o elenco resite e solta aquela risada alta por um comentário da platéia ou por uma improvisação que não estava no roteiro.

Daquelas peças que você carrega na mente por muito tempo depois. Corra, ande, você vai adorar. Ah, Carol foi conosco e também adorou, viu? Eu, na verdade, acho que é uma bela forma de apresentarmos nossos filhos ao pensamento crítico sobre o papel da polícia, dos políticos, da imprensa na vida real.

 

Onde: Teatro TUCA – Rua Monte Alegre, 1024, Perdizes, São Paulo – Telefone 3124-9600

Sextas e Sábados às 21h30, Domingos às 18h00

Ingresso: R$ 60,00 e R$ 80,00

Escrito por Simone Fernandes

Formada em contabilidade, sempre teve paixão pela palavra escrita, como leitora e escritora. Acabou virando blogueira.

Escreve sobre suas paixões, ainda que algumas venham e vão ao sabor do tempo. As que sempre ficam: cinema, literatura, séries e animais.

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