Da perda…

“agora quem vai buscar o pão enquanto eu arrumo o café?” “eu não consigo tomar a xícara inteira de cafezinho, eu tomava dois dedos e ele tomava o resto” “quem vai lavar a louça a noite” “ele brigava comigo porque eu não usava aliança” “ele era vaidoso, sempre queria estar limpo e bem vestido”

Essas são algumas das frases que minha madrinha me falou entre ontem e hoje, desde que meu padrinho faleceu.Relacionamentos são exatamente isso: esqueça os grandes gestos, os escandalosos gestos, as flores, as demonstrações de romance. Ficam os pequenos momentos da rotina que dividimos e nos quais só paramos para pensar quando algo assim acontece.

Foram quase 50 anos de viagens, que os dois gostavam, mas de coisinhas do dia a dia, das briguinhas e das risadas. Do que faziam juntos e do que, separados, faziam com que um se lembrasse do outro.

Meus pais conheceram meus padrinhos, pouco tempo antes de eu nascer, em uma colônia de férias em Bertioga. Se tornaram grandes amigos e então vim eu. Da minha infância lembro deles chegando em casa sempre com um pacote de caramelos. Lembro das roupas lindas que eu “herdava” das minhas “irmãs postiças” mais velhas.

Lembro de uma vez em que dormi na casa deles e tive medo do escuro.
Eles sempre ligavam nos meus aniversários, comemoraram comigo meu casamento, o nascimento da minha filha. Os aniversários dela. “como está a menina?” meu padrinho falava ao perguntar da Carol.

Há dois dias meu padrinho fazia planos para viajar e voltar a tempo de estar conosco na festinha da Carol. Fez as reservas.

Ele passaria por uma cirurgia cardíaca em agosto, com certeza estava angustiado, mas estava brincalhão e de bem com a vida como sempre tinha sido – não consigo lembrar dele sem sorrir, assim como não consigo lembrar dele sem seus óculos.

“vou viver até os 100 anos” essa era uma frase dele

Minha madrinha falou que gostaria de ter mais 10 minutos com ele para se despedir. A verdade é que despedida nenhuma seria o bastante.

Nenhuma despedida será suficiente, mas ficam comigo os pequenos momentos que dividimos. Fica a felicidade de tê-lo tido em minha vida.

Fica a saudade.

Escrito por Simone Miletic

Formada em contabilidade, sempre teve paixão pela palavra escrita, como leitora e escritora. Acabou virando blogueira.

Escreve sobre suas paixões, ainda que algumas venham e vão ao sabor do tempo. As que sempre ficam: cinema, literatura, séries e animais.

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