Consumir conscientemente é pensar antes de comprar

Não, não estou pedindo que ninguém se sinta culpada ao passar o cartão de crédito antes de comprar o sapato dos sonhos, nem que todas precisam sobreviver usando apenas dois vestidos ao longo do ano todo, essa nunca foi a ideia dessa série de textos – que era para ser um só, mas definitivamente ia ficar comprido.

A ideia é que a gente pense antes de comprar, avalie com o que vamos gastar. A grande verdade é que não existem vilões e mocinhos – desde que você já tenha tirado da sua lista a parte da escravidão – e nem existe uma fórmula que funcione para todo mundo, afinal cada um tem suas necessidades, mas é possível comprar diferente quando você pensa “no processo”.

Fazer um cálculo mental antes de comprar é um começo: o quanto você usará essa peça? Uma jaqueta de couro dura quanto? Uma vida toda? Você mora num lugar em que faz bastante frio e poderá usá-la ao longo de vários meses por ano? Então é provável que ela valha o investimento, afinal estamos falando de um item cujo preço é alto.

Eu, por exemplo, parei de comprar sapatilhas de couro. Apesar de um dia eu ter achado que elas duravam a vida toda fui confrontada com a difícil realidade de que nem mesmo as mais caprichadas, costuradas a mão, resistem por muito tempo às calçadas de São Paulo. Isso porque antigamente eu me locomovia de carro e hoje ando a pé, de bicicleta, de ônibus e de metrô. Já pensou na dor no coração quando aquela sapatilha cara ganha um risco de ponta a ponta quando você precisa dar uma brecada brusca no asfalto após ser fechada por ônibus?

Então, para mim, para meu estilo de vida, é preferível gastar menos com sapatilhas que acabarão durando os mesmos seis meses que as de couro ou em sapatilhas ” de plástico” da Melissa – sim, elas acabam se mostrando muito mais resistentes no dia a dia difícil de quem anda demais.

Em outros momentos, o investimento faz uma diferença enorme da durabilidade: lembram da foto do texto anterior desta série? Pois bem, nela eu estou usando uma calça jeans que tem 10 anos. Isso mesmo. Ela com certeza não foi barata – mas não custou uma pequena fortuna -, mas é de excelente qualidade, capaz até mesmo de resistir bravamente até hoje aquele gasto na parte interna das penas que toda calça jeans sofre.

Eu tenho um teoria, minha, de que calças jeans de algodão, sem elastano, duram mais em geral. Isso porque seu tecido é mais grosso e tem uma trama – a forma como os fios se cruzam no tecido – mais fechada, aumentando a vida útil da calça. Mas não é só isso, porque eu já comprei calças de algodão puro que duraram menos, simplesmente porque são mais finas.

Ainda usando a tal calça como exemplo: vamos dizer que eu tenha pago nesta calça R$ 200,00, que é o preço médio de uma calça da mesma marca hoje. Eu nem saberia contar quantas vezes eu a usei a cada ano, mas numa conta besta, considerando que eu uso mais vestido do que calças, vamos dizer que eu as usei 10 vezes por ano. Em 10 anos isso nos dá 100 vezes. Diluindo seu custo pelo uso eu tenho que cada vez em que eu usei essa calça eu gastei, na verdade, R$ 2,00. Virou pouco, não é mesmo?

Claro, temos a categoria de roupas e calçados para festas, que custam mais caro. Algumas vezes podemos driblar esse custo com peças neutras, como os tais vestidinhos pretos acompanhados de acessórios mais vistosos, mas algumas vezes acabamos morrendo em uma pequena fortuna para usar apenas uma vez. Nestes casos é sempre válido verificar se uma amiga não tem algo ou ainda avaliar quanto sairia alugar um vestido seminovo. Quem sabe você conclui, ao final de tudo, que vai comprar mesmo, o importante é você ter pensado um pouco nas opções.

E isso significa pensar também no que é mais barato. Não só porque ele pode envolver escravidão ou roubo, como eu falei no texto anterior, mas porque o mais barato pode não durar.

Quantas de vocês tem peças no guarda-roupa compradas nos fast fashion da vida e que nunca saíram de lá porque, apesar do preço camarada, o caimento não é bom, o tecido esquenta horrores, a costura se desfez, o botão caiu – existem casos em que ele já vem caído da loja mesmo – ou não combina com absolutamente mais nada que você tem?

Não adianta ser barato se você não usar, não é mesmo? A continha de que eu falei acima ia ficar: preço total pago dividido por 1…. R$ 69,90 a saída?

De novo: não existe regra sem exceções e eu mesma já aproveitei boas coisas nessas lojas. Camisas brancas são um item que sempre compro em uma delas, porque uso muito, o que acaba amarelando o tecido logo e então precisam de substituição.

O segredo está aonde? Pensar antes de comprar: experimente na loja e em casa logo que chegar, algumas vezes isso dá uma diferença enorme e garante tempo para troca por arrependimento; cheque a etiqueta, sempre prefira tecidos naturais, poliéster, por exemplo, esquenta horrores; verifique as costuras, veja se todos os botões estão lá, abra e feche o zíper várias vezes para ver se ele aguenta o tranco.

Fez tudo isso, tem certeza de que não é uma boa, ainda assim ficou louca por aquela saia da moda que você usará somente uma vez? Ah, até eu devo ter uma peça dessas no guarda-roupa. Mas tenha certeza de que seu guarda-roupa inteiro não será só dessas peças.

Por último, se eu ainda posso dar mais algum conselho não solicitado: conheça seu bairro, sua cidade, as lojas online de pequenas costureiras. Muitas vezes você acha que será uma fortuna e não é. Em outras você terá achados nem imaginados, um vestido dos seus sonhos, uma camisa com um detalhe que faz toda a diferença e que não custará trezentos reais.

Além disso, serão peças quase que únicas, algumas vezes feitas exatamente para o seu tamanho, com seu jeito sua cara.

Você também estará incentivando a produção artesanal, eliminando intermediários, conhecendo quem produz – clique no banner e conheça mais sobre o manifesto Compro de Quem Faz.

Você estará ajudando outras pessoas a realizar sonhos, conquistar espaço. Um jeito mais sustentável de pensar o consumo, não é mesmo?

manifesto compro de quem faz

*Este é o último texto de uma série de três sobre Consumo.

Escrito por Simone Miletic

Formada em contabilidade, sempre teve paixão pela palavra escrita, como leitora e escritora. Acabou virando blogueira.

Escreve sobre suas paixões, ainda que algumas venham e vão ao sabor do tempo. As que sempre ficam: cinema, literatura, séries e animais.

3 Comentários


  1. Essa sua série está muito legal, Si. O ponto crucial, como sempre, é o equilíbrio – e, no caso do consumo, pensar bem antes de comprar, em vez de deixar-se levar pelo impulso, exatamente como você mostrou.

    Eu invisto em calça jeans porque tenho um quadril complicado, nem tudo me cai bem. Em compensação, as minhas também duram anos. Vestidos são mais fáceis, posso pagar menos por eles e mesmo assim ter um bom caimento, e neles posso aproveitar, de vez em quando, as modinhas. Em todo caso, parei há alguns anos de querer ter quantidade e passei a investir em peças duráveis, atemporais e que combinem com meu corpo.

    Pra sapatilhas, recomendo fortemente as da Moleca. Pra quem bate perna, duram cerca de um ano, mas compensam pelo precinho e pelo conforto. Piccaddily também é uma boa pedida. Também abandonei os sapatos de couro para o dia a dia, ficam feios rapidinho.

    Responder

    1. Sim, Lu!!! Às vezes eu fico achando que esses sites como o Ali Express despertou o pior nas pessoas, que antes não compravam o que não precisavam porque o preço era mais caro.

      Adoro as sapatilhas da Moleca, tanto para mim como para a Carol, e vou dar uma olhada nas da Piccadily.

      Beijos

      Responder

      1. Pois é… a gente tem que se controlar pra não sucumbir ao consumismo.

        Costumo comprar piccadilly pelo site da própria marca, já que a distribuição em Brasília é horrível (e o site é ótimo). Se for fazer o mesmo, sugiro comprar um número maior que o normal. É tanto acolchoado que a numeração fica muito justa, ainda mais pra quem bate perna (os pés sempre dão uma inchada no fim do dia).

        Responder

Deixe uma resposta