Conexão Natureza

A casa dos meus pais ficou pronta tem bem uns vinte anos. O sonho do meu pai sempre foi ter uma casa na praia, pertinho do mar para ele poder pescar todo dia, mas ele nunca gostou de bagunça, balburdia e trânsito. Encontrou um jeito de ter as duas coisas que queria: construiu uma casa em um condomínio que fica bastante perto de uma praia menos movimentada, de tombo, o bastante para ir andando, mas ainda assim um lugar calmo, dentro de uma reserva ambiental, sem fogos, sem trânsito, sem filas.

Do outro lado da rua uma cachoeira forma uma pequena piscina e depois um riozinho. Aqui a gente dorme com repelente no corpo por conta dos borrachudos, em compensação ouve o som da água descendo e dos passarinhos conversando, o dia todo.

Com o tempo mais gente foi descobrindo o lugar, mesmo com o GPS sendo incapaz de indicá-lo (como podem ver acima) e, bem, perdeu parte da graça.

Vejam só: virada de ano, o condomínio está lotado, na maioria pessoas que alugaram casas, carros cortam as ruas indo e vindo, de preferência bastante rápido, em distâncias inferiores a cinco quilômetros. A maior parte deles carrega rádios cujo volume ultrapassa o bom senso, normalmente com músicas de gosto duvidoso, assustando pássaros e cães e tirando a paz dos vizinhos.

Outro dia, da rede na frente da casa dos meus pais, eu observava o movimento da rua. Um casal estaciona seu carro do outro lado da rua, observa a mata e a cachoeira, conversam, jogam as bitucas de cigarro e uma latinha no chão, voltam para dentro do carro e seguem seu caminho.

De volta à cidade é provável que contem aos amigos desse paraíso que descobriram, mas não devem contar que deixaram lixo pelo caminho.

Parece que não existe mais conexão entre eles e a natureza, que eles simplesmente não sabem mais como podem aproveitá-la longe de seus carros, de seus iPods, de sua rotina. Eles param para olhar, mas não veem.

Escrito por Simone Miletic

Formada em contabilidade, sempre teve paixão pela palavra escrita, como leitora e escritora. Acabou virando blogueira.

Escreve sobre suas paixões, ainda que algumas venham e vão ao sabor do tempo. As que sempre ficam: cinema, literatura, séries e animais.

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